MUDAR DE ESCOLA NO MEIO DO ANO: SOLUÇÃO OU ILUSÃO?
O cenário é comum: em julho, muitas famílias já percebem que seus filhos estão com grandes chances de reprovação e, na tentativa de evitar o desfecho temido, optam por transferi-los para uma escola considerada “mais fácil”. Embora a decisão pareça prática, ela pode trazer consequências emocionais e educacionais significativas.
A decisão do aluno e a cumplicidade da família
Quando um estudante decide não se dedicar aos estudos, ele, mesmo que inconscientemente, assume o risco da reprovação. Muitos adolescentes acreditam que, no final, haverá uma solução que evitará consequências maiores – como uma transferência de escola ou uma “segunda chance”. Essa crença, muitas vezes, é reforçada pela postura dos pais, que cedem diante de promessas de mudanças futuras.
A psicóloga Maria Raquel Gonçalves de Araújo alerta para os riscos dessa abordagem. Mudar de escola no meio do ano pode reforçar na criança a ideia de que há soluções milagrosas para problemas que exigem dedicação e esforço. Ao evitar que o filho enfrente as consequências de suas ações, os pais perdem uma oportunidade valiosa de ensinar responsabilidade e resiliência.
A reprovação como aprendizado
Embora temida, a reprovação pode ser uma lição importante. Ela ensina que comportamentos negligentes têm consequências e que o esforço é necessário para alcançar objetivos. “A reprovação pode ser o grande aprendizado para uma nova tentativa, com um sabor mais ‘suado de vitória’”, explica Maria Raquel.
Esse aprendizado só é possível quando a reprovação é conduzida com apoio e reflexões. Ao contrário, mudar de escola pode transmitir a mensagem de que as dificuldades podem ser resolvidas com atalhos, sem a necessidade de mudar atitudes ou comportamentos.
Dinâmica familiar e a negociação com os filhos
Os filhos geralmente têm confiança de que conseguirão convencer os pais a optar pela transferência de escola. Isso decorre de uma dinâmica de negociação construída desde a infância. Muitos pais, temendo desgastes ou conflitos, assumem uma postura de amizade com os filhos, deixando de exercer seu papel de autoridade.
Na literatura psicanalítica, essa relação é descrita como circular, sem hierarquia clara, onde a opinião dos filhos tem o mesmo peso que a dos pais. Relações saudáveis, no entanto, são triangulares: os pais ou responsáveis tomam as decisões com base no melhor interesse dos filhos, ainda que isso implique em frustrações momentâneas.
O papel dos limites
Dar limites é essencial para o crescimento saudável de qualquer criança ou adolescente. Isso inclui permitir que eles enfrentem frustrações e aprendam com os erros. Uma reprovação pode, sim, ser um marco para o desenvolvimento de habilidades como autodisciplina, planejamento e responsabilidade.
Mudar de escola no meio do ano pode parecer uma solução rápida, mas muitas vezes é um atalho que evita lidar com questões mais profundas. Antes de optar pela transferência, é importante refletir sobre o impacto dessa decisão no aprendizado e no amadurecimento do aluno. Afinal, não se trata apenas de evitar uma reprovação, mas de formar adultos responsáveis e resilientes.